O que fazer com ela?


Você estar em uma cidade diferente da sua é uma experiência, no mínimo, interessante, desafiadora, instigante. Conhecer as ruas, entender os nomes, passar pelo processo natural de adaptação é preciso. Esta é a prova inicial para testar a sua capacidade longe de amigos e, em especial, distante da família. Foi-se o tempo da comidinha da mamãe, do cafuné da irmã, do generoso aperto de mão do pai, do carinho daquela menina, da parceria dos amigos cotidianos. Eita coisa boa que fica no passado.
Aqueles que te apóiam, que te oferecem o ombro, quando necessita, ou mesmo os que estão prontos para comemorar as suas vitórias parecem tão longe, que deixam de fazer parte de sua vida. Novos rostos, novas personalidades, novas parcerias, quem sabe, logo surjam. Tudo é novidade, é experiência inédita, é inesperado. Contudo, durante a rotina do trabalho – se é que pode se chamar de rotineira a função que permite estar em um lugar diferente em cada dia, tendo contato com pessoas e histórias ímpares – tudo é normal, comum, parecido, coisas que você já vive, mas que ainda encantam, resultado da paixão por esta profissão, o jornalismo.
O diferencial surge com o desaparecimento do sol. A noite, quando você retorna para seu apartamento e olha aquela cama enorme, sua comida por fazer, a louça para lavar, aí é que muda. Então ela está lá, a sua espera. Todos os dias uma face diferente, mas sempre poderosa, rigorosa, às vezes, gostosa, geralmente, temerosa. É quente ou é fria e lhe acompanha durante toda a noite, lhe atrai e lhe deprime, lhe faz sorrir, chorar, gemer, mesmo sem sentir qualquer que seja dor. O que fazer com ela? Como agir? Qual o passo certo a se dar? A solução é ir para o banheiro, encarar o seu rosto no espelho e dizer que você pode, que você é capaz, que tem vontade e capacidade para saciá-la, desfrutá-la, fazer da sua estada com ela a mais comum, simples e indolor de todas. Após isto, passar para outra.
Não há dúvida de que se consegue. Não há dúvida de que ela também é falível e, possivelmente, derrotável e que podemos dobrá-la ao nosso interesse, fazendo com que ela seja dominada, humilhada, transformada em motivo de gozação. Ao mesmo tempo, não há dúvida de que um dos nossos maiores males é ela. Ah, maldita solidão!

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