Emudece A Dona da Noite


Era criança e acompanhava minha mãe em um dos tradicionais eventos de bairro: a Rua do Lazer. Ao chegar na rua em frente à Escola Barão de Antonina, no Bairro Colônia 20 de Setembro, uma surpresa mais do que especial, que beirou ao encantamento. 

No microfone, animando crianças, adultos e idosos, estava uma voz suave e, ao mesmo tempo, empolgante, única; que não raramente esticava o "r" mais como forma de chamar a atenção do que por qualquer eventual sotaque o vício de linguagem. Era artista sem perder a simplicidade e a vontade de dar aquele abraço apertado em todas as pessoas. Era a Maria Neci de Vargas Klagenberg (na foto, com a filha Shirlei). 

Neci, para muitos; às vezes, Maria, para mim - pelo hábito de falar o primeiro nome de quem tem dois; fez história no rádio da região. Teve destaque por uma série de iniciativas no meio radiofônico, mas foi com o programa A Dona da Noite, que ganhou muita expressividade no Vale do Taquari e até fora dele. Com músicas românticas e um jeito único de apresentar, fez do rádio noturno o companheiro para homens e mulheres, especialmente, os que viviam só.

Chegar a ser colega de trabalho, entre 1997 e 2000, foi mais do que dividir o mesmo espaço. Estava ali, real, em carne, osso e humildade aquela mulher que, antes, era a voz almejada, era uma motivação para querer atuar neste veículo que embebeda e inebria quem por ele passa. 

Daí para diante, foram inúmeras histórias e ensinamentos. Dormimos ao relento, na área de camping, em uma "banca" da Rádio Açoriana, durante a realização da Motonáutica - e acordamos sob chuvisqueiro; subimos em carros alegóricos, em plena avenida do samba, para entrevistar os destaques do Carnaval; vi correr escadas para colocar a rádio no ar, dar gargalhadas e fazer gargalhar; entrevistar autoridades e abrir espaços para o público, que tradicionalmente não é reconhecido pela mídia.

Maria, professora, mãe, irmã, avó, bisa, radialista, colega Neci. Talvez não tenha aproveitado como devia o decorrer da vida, mas estava fazendo isto, mais recentemente, viajando, curtindo seus amigos, e vivendo em plenitude. A plenitude que a fez presidir a Sociedade Carnavalesca Irmãos da Opa, liderar grupos de idosos, ser uma voz ativa na política de Taquari; plenitude que coloca aquela que pedalava sua bicicleta, atravessando o Bairro Coqueiros para chegar na rádio, como uma grande taquariense.

A Dona da Noite continuará brilhando, agora, como uma estrela no céu; o microfone se cala, e o som deste silêncio alimenta a saudade, mas não apaga a lembrança do sorriso aberto e contagiante. Um salve para Maria Neci de Vargas Klagenberg.  

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